À conversa com … #2 Júlia Durand

O 2.º episódio de À conversa com… foca-se no percurso de Júlia Durand, destacada com a 4ª Menção Honrosa no Prémio de Dissertação Excepcional 2024 da IMS.
À conversa com… reúne uma série de entrevistas escritas que destacam a premiação nacional ou internacional do trabalho de investigadores associados ao CESEM.

Pergunta (P): A tese de doutoramento “Ferramenta, retalho ou papel de parede: a música de catálogo na criação audiovisual online” foi distinguida pela International Musicological Society (IMS) no contexto do Prémio de Dissertação Excepcional (Outstanding Dissertation Award). Qual o significado que atribui a esta menção honrosa?

Resposta (R): Tive três motivos para ficar especialmente feliz com a menção honrosa. Em primeiro lugar, é de certa forma uma legitimação do estudo de um objecto musical que, até recentemente, era descartado como sendo de reduzido interesse artístico e académico. É também um reconhecimento de uma investigação musicológica realizada em português, num panorama académico global que pende para o anglocentrismo. Já o terceiro motivo é mais pessoal. Diverti-me absurdamente com a minha investigação de doutoramento, e perguntei-me mais que uma vez se a falta de sofrimento era sinal de um trabalho pouco sério – afinal, talvez não.

P: O tema da tese premiada revela um dos seus maiores interesses no que ao pensamento sobre música diz respeito: a produção e utilização de música de catálogo em vídeos online. Actualmente, a sua investigação também abarca o papel da música nos media online com intuitos políticos e de desinformação. Discorra um pouco sobre este dois temas, ressaltando as razões pelas quais os tomou como objectos de estudo.

R: No que toca à música de catálogo, sempre me atraiu o seu lado de presença sonora discreta, de artesanato musical que passa despercebido, e sobretudo, de música que é concebida para imagens imaginadas. Acabei também por valorizar muito o facto de, mantendo um pé na música de catálogo, poder analisar diferentes tópicos a partir daí: estereótipos musicais; géneros e sexualidades; música e tempo; música e política. Essa última questão liga-se com os tópicos que tenho vindo a explorar mais recentemente (e cujo interesse e relevância serão talvez mais óbvios): a música usada atualmente em media com desinformação, fake news e extremismo político é frequentemente música de catálogo.

P: Fale-nos da sua relação com o CESEM, onde é actualmente investigadora integrada.

R: Tive o meu primeiro contacto com o CESEM em 2015, e o centro enquadrou a minha investigação de mestrado e de doutoramento. Nos agradecimentos da minha tese, escrevi a esse propósito: “Não querendo incorrer na agora frequente gaffe de chamar às instituições de acolhimento “instituições acolhedoras”, não posso contudo deixar de afirmar, com carinho e orgulho, que ambos os termos se aplicam ao CESEM”. Dois anos depois, com todo o apoio que o centro me tem dado em várias aventuras pós-doutoramento, esse sentimento só se reforçou.

P: Lecciona, desde 2021, disciplinas em torno do tema música e media na NOVA FCSH, oscilando entre os departamentos de Ciências Musicais e Ciências da Comunicação. Quais os desafios que encontra? Considera que o tema instiga a atenção dos discentes?

R: A minha experiência até este momento enquanto docente foi extremamente gratificante. Os tópicos abordados na cadeira de Música, Media e Culturas Digitais, por exemplo, suscitaram um vivo entusiasmo por parte dos estudantes, que também valorizaram especialmente a oportunidade de desenvolver uma investigação original sobre temas do seu interesse, como a música em media audiovisuais ou em plataformas de streaming. Curiosamente, os desafios – como a atenção fragmentada pelo consumo de diferentes media, ou a utilização de inteligência artificial – podiam eles próprios ser discutidos nas aulas, dado que estavam intimamente ligados aos conteúdos da cadeira.

P: Algum objectivo ou projecto futuro – seja enquanto musicóloga ou docente, seja enquanto criadora para peças vocais e de teatro musical, actividade que desenvolve em paralelo – que possa partilhar connosco?

R: Estou neste momento no processo de transformar a tese em livro, já contratualizado para publicação na editora britânica Bloomsbury. De resto, quanto a projectos futuros, vou tentando encontrar um caminho que permita conciliar os diferentes tipos de escrita que essas actividades implicam: a escrita científica, e a escrita de ficção ou para teatro musical. Na verdade, penso que é quando essas escritas se fundem um pouco que as experiências mais alegres se encontram.


Seguiremos atentos ao percurso de Júlia Durand. Enquanto isso, continuaremos À conversa com…