Nuno Mendonça Raimundo

O Cancioneiro Musical de Paris é uma fonte de extrema importância na história musical e literária da Península Ibérica, e assume uma presença relevante na história da música do Renascimento europeu. De facto, trata-se da maior colecção portuguesa de música secular quinhentista conhecida, com 125 peças musicais palacianas em português e castelhano, e que apresentam várias correspondências com outros cancioneiros portugueses e espanhóis da época, ajudando a traçar o cenário da cultura músico-literária nas cortes ibéricas e do seu intercâmbio. François Reynaud foi o primeiro a estudar e a transcrever o cancioneiro, entre 1966 e 1968, no âmbito da sua tese de doutoramento; infelizmente, este estudo nunca foi publicado e o seu acesso é difícil. Manuel Morais inseriu o seu estudo e transcrição do Cancioneiro de Paris no volume _Vilancetes, cantigas e romances do século XVI (1986)_, juntamente com o seu estudo do Cancioneiro Musical da Biblioteca Nacional de Lisboa (manuscrito P-Ln CIC 60). Mais recentemente, o musicólogo Manuel Pedro Ferreira dedicou igualmente parte da sua _Antologia de Música em Portugal na Idade Média e no Renascimento_ (2008) a uma descrição e análise originais deste códice, identificando diversos conjuntos de peças segundo características comuns Œ tanto segundo o seu género como segundo a mão que as copiou Œ e procurando localizá-los no tempo e no espaço, principalmente através das características do seu texto e da sua música, mas também do tipo de notação utilizado. Este estudo, ainda que sumário, aponta um novo caminho de análise deste manuscrito: o enquadramento dos seus textos e da sua música nas correntes europeias da época, que não só permitem a sua definição temporal e geográfica como possibilitam a compreensão do seu papel num contexto histórico-cultural mais vasto. Para esta nova perspectiva, contribuem também os novos códices musicais e trabalhos teóricos que entretanto vieram a luz, que permitem estabelecer novas concordâncias e analisar o manuscrito sob critérios mais alargados. O nosso trabalho pretende não só fazer uma síntese da informação recolhida e tratada pelos trabalhos anteriores, como se propõe analisar o conteúdo do cancioneiro sob novas perspectivas. Concretamente, partimos da descrição exaustiva de Reynaud no que toca a certos aspectos do cancioneiro, e adicionamos-lhe as perspectivas de análise e reflexão abertas por Ferreira.